segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Problemas no coração do profeta


Por: Ezequiel Netto Data: 28/12/2011

Este artigo é o décimo de uma sequência sobre dons proféticos, assunto que o autor vem pesquisando desde 2002 e compartilhando em muitos lugares.

No artigo de número 6 desta seção, falamos um pouco sobre os princípios de interpretação de uma palavra profética, destacando que toda profecia é composta por 3 fases:

  • Revelação – o que Deus nos mostrou, muitas vezes de forma simbólica e por enigmas;
  • Interpretação – quando descobrimos o significado da palavra profética;
  • Aplicação – ou que atitude teremos a partir daquela revelação.

Vimos que a maioria das pessoas não têm problemas com a revelação em si, mas com interpretações erradas do que receberam da parte de Deus. E, por conseguinte, se a interpretação foi errada, as atitudes tomadas a partir disso também o serão.

Vimos que precisamos depender de Deus também para interpretar, e não usar da lógica humana ou até mesmo chegar a conclusões precipitadas para assuntos que nos parecem tão claros.

Para uma correta interpretação, não basta apenas termos uma compreensão do simbolismo. A interpretação passa por um processo em que nosso entendimento desses princípios interage com nossa sensibilidade ao Espírito Santo e também com a postura de nosso coração, se está ou não limpo e totalmente entregue ao Senhor.

Existem dois problemas em nosso coração que podem causar erros de interpretação, mesmo quando temos entendimento sobre o simbolismo na profecia:

  1. Quando nosso coração não está bem com Deus (um espírito de orgulho nos torna “não ensináveis”, o que leva a falsas interpretações);
  2. Quando nosso coração não está bem em relação às pessoas a quem estamos ministrando (feridas, amarguras, preconceitos).

Nosso coração precisa estar reto diante de Deus e puro perante as pessoas para que possamos interpretar corretamente as revelações proféticas. Uma revelação nos é dada como uma pedra para edificação e, quando é mal interpretada, torna-se para nós uma pedra de tropeço. Devemos crescer em conhecer o simbolismo, e também precisamos manter nosso coração cada vez mais purificado diante do Senhor, para sermos usados profeticamente. Ter comunhão com Deus é o elemento mais importante para interpretação de sonhos, visões e revelações (Ap 19.10b).

José e Daniel foram usados por Deus para interpretar sonhos mais que qualquer outra pessoa na Bíblia. Tinham ministérios e chamados muito semelhantes e trilharam caminhos totalmente diferentes até que Deus pudesse usá-los em seu propósito. José demonstrava ser orgulhoso desde a juventude, enquanto que Daniel escolhera o caminho da humildade. Os anos de sofrimento na vida de José foram necessários para quebrantá-lo e amadurecê-lo, o que podemos perceber em sua posição diante dos irmãos (Gn 37) e depois diante de Faraó. Daniel, apesar de sábio e de família nobre, já era humilde e quebrantado, e não precisou passar por sofrimentos para ter condições de servir a Deus diante do rei, interpretando revelações. Ele foi um dos poucos homens que escolheu espontaneamente este caminho. José e Daniel sabiam que a base para interpretação era conhecer a Deus (Gn 40.8/41.16; Dn 2.27-28). O orgulho nos torna independentes de Deus, e a humildade nos aproxima mais dele (Jo 5.19; Tg 4.6-8). Além de humilde, nosso coração precisa ser puro para vermos a Deus e conhecermos sua vontade (Mt 5.8).

Obstáculos que nos impedem de interpretar corretamente

1. Opiniões pessoais

Em vez de buscarmos em Deus a interpretação, muitas vezes somos tentados a decifrar logicamente a visão, com nossos pensamentos e opinião a respeito do tema. Isto é uma forma de orgulho. Precisamos do que está na mente do Senhor, e não na nossa. Um tipo de opinião perigosa é quando ela está relacionada com uma doutrina predileta, que é um ensino que elevamos a uma posição mais alta que os demais, e analisamos as coisas através deste filtro.

Vamos tomar por base um exemplo típico em nosso meio: Deus nos revela que um casal está tendo conflito e crise conjugal. Aqueles que valorizam demasiadamente as doutrinas de autoridade e submissão vão dizer que a mulher precisa se submeter ao marido, que o marido precisa amar sua mulher etc. Por outro lado, os irmãos com forte chamado evangelístico já vão achar que os problemas são decorrentes da falta de conversão genuína. Um adorador já diz que o casal deve ter momentos para adorar a Deus juntos. Ainda há aqueles que perguntam se o casal sabe invocar a Jesus.

2. Feridas e amarguras

As feridas e falta de perdão funcionam como um muro que impede que vejamos o que Deus está dizendo. Toda revelação negativa sobre uma pessoa ou grupo que tenha nos ferido deve ser considerada suspeita. Problemas do passado com uma liderança também podem fazer com que alguns interpretem negativamente e de forma bem dura uma revelação sobre estas pessoas. Em vez de construirmos, encorajarmos e confortarmos, nossa revelação será destruidora e desencorajadora. José aprendeu a perdoar todas as injustiças sofridas e se tornou muito útil em interpretar revelações.

Atualizando o ditado popular, podemos dizer: “Quem canta seus males – espanta!” A pessoa amargurada só traz palavras negativas, afastando os que estão ao seu redor.

3. Pecado e amarras espirituais

O pecado, escravidão espiritual, fortalezas malignas (como a cobiça, rebeldia, amargura, religiosidade, arrogância, impaciência), tudo isso perverterá nosso entendimento, gerando falsas interpretações.

4. Juízos carnais

Estes também são opiniões, sendo que mais traiçoeiras, pois tentam passar por discernimento espiritual. Ocorrem quando julgamos pela aparência exterior. Até mesmo Samuel, um grande profeta do Antigo Testamento, tinha esta deficiência (1 Sm 10.24/16.6-7). Uma boa maneira de nos livrarmos deste problema é ministrarmos de olhos fechados ou não vermos a pessoa para a qual estamos ministrando. Nossa interpretação não pode estar baseada em se a pessoa usa terno e perfumes caros, tatuagens e alargador na orelha, jeans rasgado e sujo ou coisas parecidas. Uma ovelha pode estar suja hoje e ser poderosa nas mãos de Deus, bastando apenas um bom mergulho nas águas do Espírito. E há engravatado tão maldoso que não muda nem na base da paulada.

O que é mais importante

É necessário crescimento e amadurecimento para desenvolvermos a habilidade de interpretar. Isto não acontece da noite para o dia. É importante conhecermos os símbolos, e também crescer na essência do que é ser profético – a dependência de Deus. Não podemos crescer no ministério profético sem dependência do Senhor e intimidade com ele. Para ouvir a voz doce e suave do Espírito, devemos estar bem próximos a ele, já que ele não se encontra gritando pelas praças.

O treinamento através do sofrimento

O sofrimento tem um papel importantíssimo no nosso amadurecimento espiritual, com reflexos bastante positivos no ministério profético. Depois de passar pela tempestade, os discípulos de Jesus chegaram transformados à outra margem do mar da Galileia. E por que razão Deus nos treina através do sofrimento?

  1. Para remover o orgulho, o sentimento de elite espiritual, de soberba, de achar que é o centro do avivamento.
  2. Para que reconheçamos nossa extrema necessidade de outros ministérios no corpo de Cristo. Devemos amar toda a igreja, e não apenas os que se parecem conosco e agem como nós.
  3. Para obter maior sabedoria e entendimento no processo profético. Não podemos subestimar o potencial profético de trazer efeitos negativos e não apenas positivos. O ministério profético tem tendência à manipulação e controle do rebanho e orgulho espiritual.
  4. Para mudar o conceito de uma igreja que abranja toda a cidade. Existe um ensino que diz que toda cidade deve ser governada por um presbitério único, em que a ênfase é colocada na estrutura, e não em relacionamentos de amor.
  5. Para que haja prestação de contas. Existe a necessidade de todo ministério ter pessoas maduras e responsáveis às quais devemos prestar contas, tanto no contexto local, como fora dele. É necessário que nos submetamos a pessoas com autoridade de nos corrigir e disciplinar.
  6. Para que compreendamos a necessidade de uma equipe ministerial equilibrada. As pessoas proféticas de alta tensão, com suas manifestações espirituais inusitadas, precisam do equilíbrio de pastores compassivos, teólogos dedicados e demais ministérios. A integração ministerial traz equilíbrio e estabilidade à igreja.
  7. Para que tenhamos condições de enxergar nossas fraquezas encobertas e falhas escondidas. Deus aplica em nossas vidas várias formas de disciplina visando a nossa purificação. Podemos reagir a tudo isto de maneira correta, que é suportar sua disciplina redentora, sabendo que é para nosso bem, para que possamos participar de sua santidade (Hb 12.7,10), ou reagir de forma errada, como: desprezar a correção, negando nossa necessidade de ajuste, alegando que os problemas são ataques de Satanás; cair na paralisia da autocondenação e desespero; e ficar amargurado contra Deus.

Crenças erradas no ministério profético

Existem alguns entendimentos referentes ao ministério profético que dificilmente são ensinados, mas que acompanham muitas pessoas, gerando muita confusão e aumentando a rejeição que muitos têm por este importante segmento da igreja. Escolhemos os três mais comuns:

1) Caráter = Unção

Muitas pessoas presumem que dons espirituais e unção são sinais de caráter transformado, concluindo também que o caráter é a base para recebermos os dons da parte de Deus. Outro erro é acreditar que as pessoas mais espirituais, maduras e santificadas são aquelas que têm os dons mais abundantes. Um fato importante com que devemos tomar bastante cuidado é que a maioria das pessoas proféticas não tem o dom de liderança essencial para a saúde, o equilíbrio e a segurança da igreja. Uma igreja guiada exclusivamente por profetas não oferece um ambiente seguro para o povo de Deus. O fato de haver poder e revelação fluindo através de determinados ministros proféticos não é necessariamente um sinal de que Deus está contente com as outras áreas de suas vidas.

2) Unção significa endosso divino para o estilo ministerial

Profetas tendem a pensar que o método ou estilo que usam são essenciais ao fluir da unção em suas vidas. Muitos benefícios trazidos à igreja pelo ministério profético são acompanhados de problemas relacionados ao estilo e metodologia heterodoxos que este ministério adota. Em muitos casos, precisamos ter coragem e dizer: “Você precisa parar com isto!” Temos uma forte tendência a sistematizar experiências espontâneas. Pensamos que se descobrirmos o método-chave, conseguiremos controlar as manifestações. Cremos que a unção vem ao cantarmos certa música, quando arrumamos as cadeiras de certa forma, quando se toca o saxofone, da mesma forma que o jogador de futebol acredita que seu time ganha quando está jogando com aquela meia velha e furada. As pessoas que chegam a este ponto sentem-se pressionadas a dizer que Deus está operando, mesmo quando não está. Este erro é terrível. Uma boa maneira é fazer como Elias e derramar água sobre nossos sacrifícios (1 Rs 18), dependendo exclusivamente de Deus, que manifestará seu poder sem a nossa ajuda.

3) Unção significa 100% de exatidão doutrinária

Na história da igreja sempre apareceram pessoas muito ungidas que adotaram doutrinas esquisitas. Um exemplo disto é William Branham, que acabou caindo em heresias. Ele acreditava que se Deus lhe dera tanta revelação profética, por que também não lhe revelaria a sã doutrina? Quando as curas, profecias e milagres passam a ser comuns, os profetas ficam insatisfeitos e querem se tornar mestres.